sábado, 3 de abril de 2010

18/01/2010
A latinização da política para a América Latina

Marcela Sanchez NYT News Service
Não deveria ser surpresa para ninguém que o primeiro presidente afro-americano dos Estados Unidos esteja nomeando um número substancial de latinos para o governo. Entre a minoria mais numerosa do país, que representa mais de 15% da população, dois terços das pessoas votaram em Barack Obama.

Muitas dessas designações correspondem a cargos responsáveis por traçar as políticas para a América Latina. Para alguns, essa decisão é um sinal de classificação simplista; para outros, representa a terceirização da política externa americana para um grupo étnico de eleitores potenciais.

Na realidade, não é nem uma coisa nem outra, e sim um pouco de ambos.

Alguns fatos mostram isso. Pela primeira vez na história dos Estados Unidos, os hispânicos têm um representante em uma Subsecretaria do Departamento de Estado. María Otero, de origem boliviana, é subsecretária para Democracia e Assuntos Globais. Suas responsabilidades nesse cargo não estão limitadas à América Latina, são mais gerais. Entretanto, ela dedicou boa parte de sua carreira a microfinanças na região.

O mais alto diplomata para esse território, Arturo Valenzuela, é o primeiro latino a ser confirmado como secretário-assistente de Estado para Assuntos do Hemisfério Ocidental em uma administração democrata.

Obama também nomeou Carlos Pascual e Vilma Martínez como embaixadores no México e na Argentina, respectivamente. Mais recentemente, nomeou Raúl Yzaguirre e Mari Carmen Aponte como representantes diplomáticos na República Dominicana e El Salvador.

Por muito tempo acreditei que o melhor antídoto contra a negligência de Washington para com seus vizinhos do sul seriam os latinos deste país. Quanto mais crescessem como força política, mais seriam ouvidas suas preocupações sobre as relações entre Estados Unidos e a região. Sob esse ponto de vista, essas nomeações são um progresso positivo que reflete essa influência em expansão.

Muitos também poderiam argumentar que a atenção que a América Latina receberá será maior e melhor com mais latinos no poder. Arturo Valenzuela é um bom exemplo disso. É difícil imaginar um funcionário mais bem informado do que esse acadêmico chileno-americano que passou 40 anos estudando a região.

Contudo, vários especialistas em Washington consideram que Valenzuela é uma exceção à regra entre as nomeações do presidente Obama. Ainda que reconheçam o crescente poder dos latinos, esse grupo acredita que em momentos críticos como esses, a experiência e o compromisso para com a região, mais do que a conveniência política, devem ser determinantes na hora de escolher quem ocupará esses cargos políticos.

Algumas posições, em particular, são responsáveis por questões que seriam demasiado problemáticas. Por isso, poderia ser um risco nomear indivíduos com pouca experiência na região.

Por exemplo, o mandatário americano sugeriu que a política para Cuba irá potencialmente em uma nova direção. Entretanto, a pessoa designada para ser a subsecretária assistente para América Central, Cuba e Caribe, Julissa Reynoso, é uma advogada de 35 anos de origem dominicana e ativista de Nova York. Apesar de certamente ser uma pessoa segura de si e talentosa, ela teria de enfrentar alguns dos personagens mais implacáveis da política norte-americana.

Talvez seja mais significativa a habilidade diplomática de funcionários encarregados de proteger a ordem democrática na América Latina de uma maneira melhor. Neste momento, a democracia está por um fio em vários países do continente. Por essa razão, dentro da Organização dos Estados Americanos (OEA), os Estados Unidos terão de convencer aliados na região sobre a necessidade de desenvolver mecanismos para defendê-la.

Deve-se reconhecer que a OEA é um velho clube de cavalheiros com diplomatas reticentes a mudanças. Nomear Carmen Lomellin, respeitada defensora dos direitos da mulher, como a principal representante americana da organização, talvez contribua para alcançar essa meta esquiva.

Além desses cargos importantes, a designação de pessoas que se destacaram por defender interesses latinos poderia ser uma vantagem. Provavelmente o melhor exemplo deste grupo é Yzaguirre, um proeminente líder latino que não tem medo de dizer a verdade a dirigentes, e que conta com a experiência de uma vida construindo coalizões.

Como indicou Michael Shifter, vice-presidente do Diálogo Interamericano, um grupo de estudos políticos em Washington: "O mais importante é que as pessoas escolhidas por Obama, sejam latinas ou não, assumam seus cargos com seriedade, comprometimento, com desejo de fazê-lo bem e que tenham bom instinto e capacidades".

Vale destacar que os funcionários latinos com anos de experiência em assuntos da região nem sempre demonstraram ser uma boa opção. Dois dos predecessores de Valenzuela durante o mandato de George W. Bush, Otto Reich e Roger Noriega, tinham a experiência, mas também a obsessão anti-castrista que produziu um estilo ideológico e arrogante que afetou as relações.

Nesse contexto, também surge a preocupação acerca de como são recebidos e percebidos esses representantes do governo americano por seus vizinhos. Pete Romero, que na época de Bill Clinton ocupou o cargo hoje ostentado por Valenzuela (ainda que nunca tenha sido confirmado em tal posição), lembrou que teve de demonstrar a funcionários latino-americanos que não estava nesse posto simplesmente por ser hispânico.

A melhor forma de eliminar esse preconceito, disse Romero em uma entrevista, é ter uma "política ativa e dinâmica para a região" e demonstrar que pode-se contar com a atenção do Secretário de Estado quando mais se necessita.

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